terça-feira, 23 de outubro de 2012

Uma Lição

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... Então aquele mendigo retirou-se daquela casa e voltou para estação de trem, lugar onde passava a maior parte do seu tempo. Quando chegou à estação, foi logo debruçar-se sobre o seu companheiro de longas datas, seu inseparável papelão. 

Deitado, refletia sobre o grande feito que acabara de realizar na mansão de seu senhor rico.
Mas sua reflexão foi interrompida por um som que incomodava, soando em algum lugar perto dali. 
Curioso, ele se levantou para ver o que se passava, de fato. Resolveu seguir o som. À medida em que se aproximava da origem do ruído, pôde identificá-lo melhor; era som de soluço, alguém estava chorando, por algum motivo, por alguma razão.

Chegando onde estava a voz daquele ser choroso, viu uma mulher. Na verdade uma jovem, uma linda jovem, aparentemente por volta dos seus 22 anos de idade. Bem vestida, parecia ser de alto poder financeiro. Suas malas de viagens estavam jogadas ao chão, e baixinho, ela soluçava. Estava muito triste, sofrendo por algo, ou quem sabe por alguém.
O mendigo chegou de mansinho, juntou às suas bagagens espalhadas no chão, e com suavidade tocou-lhe o rosto, e sorrindo, disse-lhe: ‘’Boa tarde senhora’’. Aquele ato, de imediato, quebrou toda resistência preconceituosa que poderia se levantar por parte da linda jovem. O soluço foi interrompido, houve uma pausa. 
A jovem lentamente levantou a cabeça, fitou-lhe os olhos, e com um som de tristeza, respondeu-lhe: ‘’Olá ’’.

‘’O que se passa menina?’’, interrogou-lhe o mendigo enquanto limpava o chão para se assentar.

Ela, olhando-o seriamente, parou por um minuto, como se estivesse arrumando as ideias bagunçadas para tentar explicar da melhor forma o que estava sentindo, e enquanto fazia isso, uma lágrima escorregara-lhe pelos olhos, molhando seu rosto, caindo em suas pernas e logo sendo sugada pelo grosso tecido de suas vestes. 

Então, ela falou num tom de certeza: ‘’Minha vida não tem mais sentido, todos me rejeitaram da pior forma, os meus amigos se afastaram de mim. Meus pais se separaram e pra piorar, o homem que me jurava amor, que dizia ser apaixonado por mim e dizia que eu era a razão de sua vida, traiu-me com minha pior inimiga, foi um golpe duro, e, sinceramente, não sei o que foi pior, se foi ser traída por ele, ou se foi acreditar que ele me amava. Eu estou só. O sorriso que havia no meu rosto, pouco a pouco, desapareceu. Hoje só sei chorar, minha vida acabou. A única coisa da qual tenho vontade é de matá-los. Só assim terei de volta o prazer da vida, simplesmente não consigo pensar em vida enquanto os dois se divertem à custa de minhas lágrimas!’’.

O mendigo olhou para ela e com um tom de desprezo disse-lhe: ‘’Ah, jovem, francamente, pensei que fosse algo mais grave, juro-te, estou decepcionado com o motivo de tuas lágrimas!’’ Com um tom de espanto, a jovem respondeu com indignação enquanto enxugava o rosto: ‘’Como assim? Por que você esta falando isso?’’. Então ele sorriu e disse: ‘’Olhe bem pra mim: Não tenho irmãos, meus pais morreram, não tenho amigos, vivo na rua, passo fome, não tenho o que vestir, mal tomo banho, sou desprezado o tempo todo pelas pessoas que todos os dias lotam essa estação, ninguém percebe que eu estou aqui, e nem por isso estou chorando. Pelo contrário, o sorriso tem sido meu companheiro inseparável em todos esses 29 anos que vivo’’.

Curiosa e ao mesmo tempo encucada com aquilo, a jovem coçou a cabeça e perguntou-lhe: ‘’Como assim? Como é que você consegue sorrir vivendo numa situação dessas? Eu não vejo motivo nenhum pra sorrisos. Com toda sinceridade seu moço, eu não sei se viveria muito tempo vivendo a vida que você vive, com todo respeito, acho que me mataria!’’.

Sorridente, o mendigo olhou-a e respondeu com cautela: ‘’Querida jovem, na verdade acho que o problema não está com as pessoas que te traíram, te abandonaram, acredito que o problema, na realidade, está centrado em você. Você só pensa em morte, vingança e coisa do tipo. Acredita que se conseguir fazer com que as pessoas que te fizeram sofrer também sofram, você conseguirá ser feliz.
Ledo engano, linda jovem, a vingança é a tentativa frustrada de devolver o mal a quem te causou feridas. Na realidade, minha filha, se vingar não te traria nada de volta, isso vale mesmo a pena? 
Sabe, todo o ódio é apenas uma questão psicológica, uma coisa que você imagina, alimentada pelo processo de retroalimentação. Na verdade, a melhor vingança que você pode fazer a quem te fez mal é dá-lhe o perdão. Porque quando você perdoa, o inimigo morre dentro de você, e deixa de te perturbar, de jantar com você, de dormir com você.
O perdão te liberta do julgo do inimigo, te faz viver livre, te faz sair da funcionalidade (viver em função do ódio). Talvez seja isso que te falte. Você ainda quer saber como consigo sorrir em meio a esse caos existencial que vivo?’’.

‘’Sim’’, exclamou a jovem com um ar de ansiedade. ‘’Tudo bem’’, concordou o mendigo. ‘’Vou lhe fazer descobrir o motivo do meu sorriso, mas antes lhe proponho um desafio: Jovem, por favor, olhe pra seus problemas e veja se consegue sorrir!’’ A jovem refletiu um pouco e disse: ‘’não, não consigo, só vejo dor e sofrimento, há três meses não consigo esboçar um sorriso, sequer’’. ‘’Ok’’, respondeu o mendigo. ‘’Agora olhe na direção daquela rua vazia e veja se consegue sorrir’’.

A jovem olhou e falou: ‘’Não, não tem graça nenhuma naquela rua, nem tem nada nela, como poderei sorrir?’’. ‘’Certo, certo’’, falou o mendigo, ‘’então olhe pra aquelas pessoas que estão passando ali do outro lado e veja se consegue sorrir’’. A jovem olhou e disse: ‘’Pare! Você não vai conseguir me fazer sorrir com essas besteiras, está ficando chato, não vou sorrir forçadamente!’’. ‘’Muito bem!’’, respondeu-lhe o mendigo. ‘’Então agora olhe pra mim e veja se consegue sorrir’’, e prontamente fez uma careta muito engraçada, e a jovem não se conteve, e eles caíram em uma deliciosa gargalhada, e ela chorou, mas dessa vez chorou de tanto rir.

Recuperado o folego e já se contendo, ele olhou pra ela e disse: ‘’Percebeu jovem? Não é que o sorriso foi embora do seu rosto. Ele sempre esteve aí, nunca saiu dos teus lábios. O único problema é que você olhava na direção errada.
Sabe querida, há um ditado que fala que os olhos são as janelas da alma. Eu acrescento que os olhos são os guias da nossa vida. São eles que nos mostram a direção pra onde devemos ir. Olhe pra você, estava caminhando rumo à depressão porque não tirava os olhos dos seus problemas.

Se quiseres saber o meu segredo de sempre sorrir apesar dessa vida que levo, eu te conto: 
O meu segredo foi nunca olhar para as circunstâncias da minha vida. Eu mantenho os olhos nos meus sonhos, e por isso ando na direção deles. Quando você tirar os olhos dos seus sonhos e colocar os olhos nas circunstâncias, fique certa de que as circunstâncias vencerão.
Qual é o seu maior sonho?’’ Perguntou o mendigo a jovem. ‘’Ser feliz’’, respondeu-lhe. 

‘’Muito bem. Vou passar-lhe a receita. Eu, um mendigo, passarei esta receita a você: Liberte-se do desejo de vingança, deixe de ser escrava do seu ego, perdoe a quem te fez mal e tire os olhos de tudo o que passou. Redirecione seu olhar para uma meta na vida, passe a olhar pra o seu objetivo, se ser feliz é o objetivo da sua existência, então é pra lá que você deve ir, e olhando, você poderá caminhar em direção a ela, você vai perceber, com o passar do tempo, que diante do seu sonho a circunstância se tornará pequena. Entenda jovem, que você jamais será feliz sem antes se libertar. Liberte-se do passado, e abra os braços, enfim, à sonhada felicidade’’.


Por: Islânio Santiago 


terça-feira, 16 de outubro de 2012

Normalmente Anormais

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Numa cidade normal, dentre outras pessoas normais, quem sabe num hospital ainda mais comum do que todos exemplos citados.
Vestia roupas costumeiras, com sapatinhos para agasalhar os pés padronizadamente usuais.
Chorava como as outras crianças, aprendia a sorrir como as outras delas, e dava seus primeiros passos da mesma forma que muitas de sua idade.
Nenhuma estranheza, peculiaridade, nada.
Tirava notas boas, aparentemente nada pra se enfatizar.

Assim nasciam pessoas que mudavam o mundo.

Para melhor dizer, ainda nascem.

Estas pessoas guardam um segredo. Acredite, está tão bem guardado, que às vezes, nem elas mesmo o sabem.
Pessoas normais, você as conhece? O que as distingue do restante do mundo? 
Um palpite? Converse com elas.

Um brinde às pessoas normalmente diferentes que encontramos por aí, e às que nos encontrarão num futuro próximo.